terça-feira, 22 de março de 2011

A CASA DE SIMÃO - VOLPINI - ROMA 2003

A casa de Simão (Lc 7,36-50)


Simão era um fariseu, fazia parte da “elite” da época, e o seu convite a Jesus podia ser visto como um ato de prestigio, dado que tanto se falava d’Ele. O convite de Simão tem um aspecto meio formal e nasce do desejo de obter alguma coisa; é a cultura do ter, ainda que não seja num sentido puramente econômico. Nesta casa, porém, acontece algo de inesperado e imprevisto: uma prostituta chega, desafia as convenções sociais, entra na casa de Simão e, sentando-se aos pés de Jesus, lava-lhe os pés com as suas lágrimas e enxuga-os com os seus cabelos. Os presentes ficam perturbados: como é possível que um profeta, que se afirma Filho de Deus, se deixe tocar por uma prostituta? Jesus não perde a calma, conta a parábola dos dois devedores e por fim concede à mulher o perdão de todos os seus pecados “A tua fé te salvou, vai em paz”.

Nessa mesma casa Jesus nos ensina duas coisas importantes: o valor do ser em vez do ter e o valor infinito do perdão. Também a nossa casa pode cair na tentação da cultura do ter, tornar-se um lugar de respeitabilidade e formalismo, pode deixar pouco espaço para o perdão gratuito entre nós, como pessoas, como casal, como pais... Em equipe podemos viver o sentido da correção fraterna e do perdão se aprendemos a falar de maneira livre e serena. Podemos também ajudar um ao outro a compreender que certas escolhas que fazemos, por vezes guiados pela mentalidade corrente, não são aquelas a que Jesus nos convida, mas podem ser o resultado de tentações do momento: o desejo de possuir, e aparecer, a cultura do prazer e do útil que leva ao consumismo, a vontade de concentrar-se nos próprios problemas sem se envolver na vida dos outros.

Correção fraterna não significa fazer uma lista de acusações recíprocas, mas sim dar-se as mãos uns aos outros e compreender se e onde nos enganamos, se e quando enveredamos por um caminho que não nos conduz a Cristo, e sobretudo aprender a perdoar e a perdoar-nos. A verdadeira escola do perdão, contudo, vive-se na relação conjugal, e somente depois pode estender-se aos filhos e aos outros.

“Hoje, como no princípio da nossa caminhada em comum, nunca tivemos medo de nos ferir, desde que estivesse preservada a autenticidade da nossa relação. Parece-nos, entretanto, que a nossa forma de perdoar mudou: não passava, antigamente, de um ato intelectual, difícil, mas voluntário. Compreendemos, aos poucos, que se pode ser autêntico, que se pode salvaguardar a clareza e a transparência, que pode haver um verdadeiro perdão recíproco simplesmente ao acolher nossos “eu” e aceitar os limites do outro com consciência dos próprios limites.

Receio por vezes mostrar-me fraco, limitado, perder a minha imagem de forte referência para os outros... somente contigo senti que me posso apresentar tal como sou e pedir para ser amado tal como sou. Acalmaste os meus receios com a tua ternura capaz de me acolher com os meus limites e insucessos.

É esse, talvez, o lugar que Deus ocupa nos nossos conflitos: Deus fez-se pessoa na pessoa de cada um de nós, é Ele que nos conclama em meio aos conflitos, às súplicas e no cansaço ligado à mudança, a não parar, a procurar sempre um encontro mais profundo, a tentar, sem esmorecer, novos caminhos. É o Deus que na nossa vida de casal nos estende por vezes a mão para realizar a plenitude de um encontro e se afasta depois para nos convidar a nos procurarmos um ao outro e a procurá-Lo com novo ímpeto, vivendo cada vez com mais intensidade o acolhimento, o perdão, a gratuidade da completa felicidade.”

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