“As fofocas
são a peste de uma comunidade”, inclusive no seminário. O “amor pelo
dinheiro” e a “vaidade” são os pecados que “o povo não perdoa ao seu
pastor”. Estudar teologia é importante, mas não se deve cair no
“academicismo” nem nas “ideologias”. São alguns dos conselhos que o Papa Francisco deu aos reitores e estudantes dos Pontifícios Colégios de Roma em um diálogo de mais de uma hora, que aconteceu durante a audiência desta segunda-feira na Sala Paulo VI do Vaticano.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi e publicada no sítio Vatican Insider, 12-05-2014. A tradução é de André Langer.
Entre recordações pessoais e brincadeiras, gargalhadas e sorrisos, Jorge Mario Bergoglio
encarou questões como o perigo do carreirismo, a necessária vida de
comunidade, a formação humana além da acadêmica. “Eu sei que vocês
prepararam perguntas, que vi, mas se quiserem fazer outras, façam-no
livremente”, disse o Papa, que no começo pediu perdão
por ter chegado meia hora atrasado, pois teve um encontro com os bispos
mexicanos recebidos em “visita ad limina apostolorum”. “Quando se está
com os mexicanos, encontra-se muito, muito bem, tanto que o tempo passa e
a gente nem se dá conta”. Bergoglio quis dirigir-se, em particular, dentre todos aqueles que chegam a Roma de todo o mundo para estudar nos ateneus pontifícios, os do Oriente Médio e da Ucrânia: “Quero dizer-lhes que estou muito próximo de vocês neste momento de sofrimento”.
Ao responder à primeira pergunta, sobre a formação acadêmica, o Papa Francisco
observou que existe “o perigo do academicismo”. “Existem quatro pilares
na formação sacerdotal: a formação espiritual, a formação acadêmica, a
formação comunitária e a formação apostólica”. “Eu não entenderia”,
explicou Bergoglio, “um sacerdote que viesse a Roma
para estudar e que não tivesse uma vida comunitária (isso não
funciona), ou que não assumisse sua vida espiritual (a missa diária, a
oração cotidiana, a lectio divina, a oração pessoal com o
Senhor) ou a vida apostólica”. Neste sentido, “o purismo acadêmico não
faz bem”. Ao contrário, “se somente se vê a parte acadêmica, há o perigo
de cair nas ideologias, e isso faz adoecer”, porque nesse caso somos
“macrocéfalos”, e “isso faz mal, é uma doença".
Quanto à vida comunitária, o Papa Francisco citou um bispo ancião da América Latina:
"é muito melhor o pior seminário do que a ausência do seminário". “Se
alguém se prepara para o sacerdócio sozinho, sem comunidade – prosseguiu
o Papa –, isso não é bom”. A vida comunitária é muito
importante, porque “há a partilha entre os irmãos", que caminham para o
sacerdócio, mas também há problemas, existem lutas: lutas de poder,
lutas de ideias, inclusive lutas veladas; e vêm os vícios capitais: a
inveja, os ciúmes... E também vêm as coisas boas: as amizades, a troca
de ideias, e isto é importante na vida comunitária. A vida comunitária
não é o paraíso: ao menos, o purgatório", afirmou o Papa
entre aplausos. De qualquer maneira, “se um sacerdote me diz que nunca
teve nenhum amigo, então algo não está funcionando”, acrescentou. Um
santo jesuíta “dizia que a maior penitência, para ele, era a vida
comunitária. Não é verdade? Mas, por isso, creio que devemos seguir
adiante na vida comunitária”.
A primeira regra é “nunca falar mal dos outros!”. “As fofocas são a
peste da comunidade”. E, ao contrário, “nós, os clérigos, temos a
tentação de não falar frente a frente, de sermos por demais
diplomáticos, aquela linguagem clerical, assim... Mas nos faz mal, nos
faz mal”, sublinhou o Pontífice de novo entre aplausos.
“Diz-se que as fofocas são coisa de mulheres: mas também de homens,
também são coisa nossa!”. O Papa recorda alguns episódios pessoais.
Logo que foi nomeado bispo, pediu ao seu secretário, um jovem
sacerdote, sua opinião: “Ele me olhou no rosto e me disse: ‘Você não
agiu bem, você não tomou uma decisão paternal”, e quando saiu, pensei:
“Jamais me desfarei dele como secretário: este é um verdadeiro irmão!"
Outra recordação que o Papa contou foi a seguinte:
quando disse ao padre espiritual que estava com raiva de uma pessoa: “E
ele me fez apenas uma pergunta: ‘Dize-me, você rezou por ele? Nada mais.
E eu lhe disse: ‘Não’. E ele ficou calado. ‘Já terminamos’, me disse”.
Depois o Papa refletiu sobre o elogio da vigilância.
“A vigilância sobre si mesmo: o que se está passando no meu coração?”
Se o coração está passando por turbulências, não se pode ver o que há
dentro dele. “É como o mar: não se veem os peixes quando o mar esta
revolto”. Nestes casos, aconselhou o Papa, é preciso
recordar o que diziam os padres russos: “Colocar-se sob o manto da Santa
Mãe de Deus”. "Alguém de vocês poderá me dizer: 'Mas Padre, no nosso
tempo de boa modernidade, da psiquiatria, da psicologia, nestes momentos
de turbulência creio que seria melhor recorrer ao psiquiatra que me
ajude...'. Não descarto isso, mas em primeiro lugar recorrer à Mãe. Nós
somos crianças na vida espiritual” e “a um sacerdote que se esquece da
Mãe, e sobretudo nos movimento de turbulência, falta-lhe alguma coisa",
“é um sacerdote órfão”. “Caso não a quiser como mãe – acrescentou em tom
de brincadeira –, garanto que vai encontrá-la como sogra, e isso não é
bom”.
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